trabalhador rural eventual ou empregado, contrata sua esposa por presunção, face ao caráter personalíssimo do contrato de trabalho,
principalmente no que toca ao empregado.
Esmiuçando os documentos acostados aos autos, nota-se que nas certidões de nascimento dos filhos da autora (Ilacyr Helena Pereira, Heller
Ricardo Pereira e Zaine Dalete Pereira) não constam a qualificação de trabalhador rural do genitor.
Conquanto inserida na certidão de óbito do pai da autora a qualificação de rurícola, o falecimento deu-se em 18/10/1987, ou seja, quando já
estava casada com o Sr. João Baptista dos Affonsos Pereira e integrava outro núcleo familiar.
Antes de contrair o matrimônio, a autora alega que exerceu atividade rurícola, juntamente com o genitor e o irmão José Roberto da Silva, em
regime de “pau de arara”, em diversas propriedades rurais localizadas na região de Franca/SP.
Nesse ponto, consigno que, a despeito da controvérsia existente, comungo do entendimento de que o trabalhador boia-fria, diarista ou volante
equipara-se ao segurado especial previsto no art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, e não ao contribuinte individual ou ao empregado rural, sendo dele,
portanto, inexigível o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício, bastando a comprovação do efetivo desempenho de
labor agrícola.
Não há, contudo, nos autos nenhum início razoável de prova material – tais como, certidão de nascimento ou de casamento, na qual conste a
qualificação de rurícola dos genitores; certidões de registro de imóvel rural das propriedades nas quais alega ter desenvolvido a atividade rural, em
especial da propriedade rural denominada Fazenda São José, de propriedade do Sr. Fábio Jacinto Lemos; declaração extemporânea de antigo
empregador; carteira de vacinação, atestado de alistamento militar ou título de eleitor em nome dos pais ou irmãos, nos quais constem a
qualificação de lavrador ou de domicílio em área rural; histórico de frequência de escola rural ou outros documentos – que demonstre o exercício
de atividade rural em regime de economia familiar.
Quanto aos vínculos posteriores ao matrimônio, a autora e as testemunhas José Coelho Pavani e Maria de Araújo Pavani relataram que a Sra.
Aparecida da Graça Silva Pereira, após se casar com o Sr. João Baptista dos Affonsos Pereira, mudou-se para a Fazenda São José, de
propriedade do Sr. Fábio Jacinto Lemos, e lá permaneceu, juntamente com os sogros, durante seis anos, exercendo diariamente atividade rural.
Declararam, ainda, que o casal mudou-se para a Fazenda Santa Marina, vizinha ao imóvel rural de propriedade do Sr. Fábio Jacinto Lemos, e
continuaram a atividade campesina por mais cinco anos. Realçaram que o casal mudou-se, posteriormente, para o Sítio Nova Jerusalém.
A CTPS de titularidade do cônjuge da autora contém registro de vínculo urbano, após o casamento, no intervalo de 01/05/1976 a 19/08/1979, o
que, por si só, contradiz os depoimentos das testemunhas no sentido de que a unidade familiar exerceu de forma contínua e ininterrupta o labor
campesino. Vê-se, ainda, registro de contrato de trabalho junto à Fazenda Santa Marina, no cargo de operador, cujo ano da admissão (1978)
contém rasura. Como já exposto, ainda que se tomasse o vínculo rural de 01/03/1978 a 30/06/1983, laborado pelo cônjuge da autora na Fazenda
Santa Marina, trata-se de relação de emprego, anotada em CTPS, com caráter personalíssimo, que não se comunica aos demais membros da
unidade familiar.
Em relação à pretensão de extensão do vínculo empregatício de 01/07/1983 a 31/12/1989, mantido pelo cônjuge junto ao empregador Mauro
Alves Silveira, no Sítio Nova Jerusalém, pelos fundamentos já expostos, não merece acolhida.
Os trabalhos desempenhados deram-se nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, mediante vínculo hierárquico, não eventual,
com salário pelo serviço prestado, o que tornam os registros personalíssimos, não podendo ser estendidos à autora para comprovar a carência.
Ora, a ampliação da eficácia probatória relativa ao início de prova material em nome do cônjuge varão repousa no fato de que a mulher, ainda que
não tenha tal qualificação nos seus documentos pessoais, auxilie o esposo nas atividades rurais, o que pressupõe que ambos trabalhem juntos e no
mesmo ambiente de trabalho. Assim, esse auxílio somente é concebível se ambos os cônjuges integrarem o mesmo grupo de trabalho rural, que o
exerce em regime de economia familiar, assim entendido como atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria
subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados permanentes, o que não se aplica no caso em comento.
Ademais, os depoimentos das testemunhas, em relação ao labor exercido no Sítio Nova Jerusalém, mostraram-se vagos e imprecisos. A
testemunha José Coelho Pavani disse que só foi três vezes na referida propriedade. A seu turno, a testemunha Vicente Antônio Barbosa
delineou que frequenta o sítio esporadicamente e nos finais de semana, quando visitava o casal após os cultos religiosos.
Com efeito, a questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal de Justiça, que exige início de
prova material e afasta por completo a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ). De acordo com o que restou definido quando do
julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a
súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material, corroborada
com provas testemunhal, para comprovação de tempo de serviço.
III – DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, extingo o processo com resolução de mérito e JULGO
IMPROCEDENTES OS PEDIDOS formulados pela parte autora.
Defiro/mantenho a gratuidade processual.
Sem custas processuais nem honorários advocatícios (arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95, c/c o art. 1º da Lei nº 10.259/01).
Havendo interposição de recurso, intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo legal e, após, com ou sem apresentação destas,
remetam-se os autos à Turma Recursal, com as formalidades de praxe.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.
Caso haja interesse em recorrer desta sentença, cientifico as partes de que o prazo para recurso é de 10 (dez) dias (art. 42 da Lei nº 9.099/95),
contados nos termos do art. 219 do CPC.
Publique-se. Intime-se. Registrada eletronicamente.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 17/03/2021 1212/2172